21.7.10

"all my loving"

será estranho, no entanto, quando, na rua, estiver tocando
“all my loving” no centro da cidade e, junto a mil pessoas,
a banda mambembe - como no fundo somos todos nós os vivos - me fizer chorar,
pois algo queima entre a espinha de Descartes e a jaqueta esfaqueada de Espinosa,
e será estranho, no entanto, pensar nas coisas da ilusão dos decretos livres,
enquanto Espinosa jaz enterrado com seu paralelismo e sua rinha de aranhas,
e Descartes coleciona condecorações em faculdades estéreis,
e minha namoradinha está em casa estudando a coisa do amor entre os povos,
e ela diria “não são bem coisas do amor”, sem muita paciência, e se eu a amo
é pela completa falta de paciência e pelo excesso de amor,
mas ela não sabe, a minha namoradinha, e nem eu bem sei, como ela diria,
que “all my loving” pode ser também suficiente, na rua, diante da banda cigana,
e talvez ela também não acredite - não posso culpá-la - que uma namoradinha
justifique uma lágrima no deserto, e as ruas irregulares onde, todos os dias,
escorremos hemorrágicos, carregados de mitos em pedra, sem paredes.

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