12.1.07

“minutos atrás”

uma vez fomos jovens
e detestávamos o tratamento “jovem”.
éramos cheios de arrogâncias e medos,
mas éramos ternos, chorávamos juntos.
os abraços eram motivos de palmas abertas
e as promessas verdadeiras promessas,
pois, sem referência, prometíamos prometer.

- e isso minutos atrás...

agora somos couraças,
menos arrogantes, ainda com medo,
preocupados em mostrar humildade –
afinal sabemos um pouco mais, não tudo
sobre os baques de um mundo frio –
e exigem de nós uma atitude particular
e ninguém sabe que atitude deve atuar,
mas todos dizem: “uma atitude madura”.
e que é uma atitude madura senão
perto de apodrecer e cair?

nós ainda somos jovens,
mas agora eles nos chamam “adultos”,
e já não nos envergonha a palavra “jovem”.
procuramos por ela livres nos nossos sonhos,
mas, como adultos, temos as raízes extraídas.
exigem de nós um comportamento adequado,
exigem que falemos dos nossos progressos,
exigem que tomemos decisões permanentes.

perdidos numa selva de signos,
tateamos atrás da nossa juventude estuprada,
que sangra silenciosamente por nossas mãos.
e aquilo que antes não nos dizia nada
hoje declara por inversão o que somos
e o que desistimos de ser por auto-afirmação.
os abraços ainda são longos, não mais eternos,
mas o sentimento, que é seu núcleo e colágeno,
hesita em olhos arregalados que já não se cruzam.
desconfiados, recorremos às sombras das ruelas
e aos gargalos do esquecimento: ruminação perplexa.

ainda damos bom-dia,
mas onde estão os dias?
à noite saímos e fazemos festa,
mas o que fizeram com a festa?
de dia dormimos como jovens,
à tarde sofremos como adultos,
à noite bebemos como velhos.
somos um todo cheio de nada,
palavras descoladas das frases.

os olhos reservam ternura em seus poros
como fossem gravatas feitas por encomenda.
de repente a loucura saiu de moda, virou tendência.
saímos de moda com nosso futuro de veias abertas.
de reis provisórios em monarquias de algodão-doce
– eles bem que nos avisaram para não ousarmos –
passamos a coringas convulsos num baralho sujo.
éramos a nova era, a esperança do óvulo primordial,
podíamos morrer por cada uma de nossas inclinações:
morríamos todos os dias só para ganhar tempo.

uma vez mentíamos apenas para pintar os cabelos
brancos de uma verdade melancólica entranhada.
hoje mentimos pois a realidade tornou-se um mito
e, mesmo assim, esperamos juntos debaixo do sol
pela ressurreição pontual da nossa pobre juventude,
que de lágrimas desconexas tornou-se ranço poético.

- e isso minutos atrás...

Um comentário:

Anônimo disse...

também sinto, meu amigo.
alvaro